quarta-feira, 13 de junho de 2018

14. Epigenética aplicada a saúde

1. Epigenética: Conceitos básicos
A epigenética, é um termo que significa “acima do genoma”, consiste no estudo das alterações na expressão de genes específicos que não dependem de mudanças na sequência primária do ácido desoxirribonucléico (DNA), mas que envolvem modificações estruturais na cromatina decorrentes da interação do indivíduo com o ambiente. A estrutura da cromatina consiste na dupla fita de DNA em espiral que enrola em torno de um octâmero proteico formado por quatro pares de histonas: H2A, H2B, H3 e H4, conforme observado na Figura 1. Assim os mecanismos epigenéticos englobam modificações tanto na molécula de DNA quanto nas histonas.

Figura 01. Desenho esquemático da cromatina, formado pelo octâmero proteico (4 pares de histonas) envolto pela molécula. Arte de: Ana kelly Vogt Kommers

2. Modificações epigenéticas em DNA

O DNA é suscetível a uma única modificação: a metilação, reação catalisada por enzimas denominadas DNA metiltransferases (DNMTs). A metilação ocorre preferencialmente nas chamadas ilhas citosina fosfato guanina (CpG), regiões do DNA com grande número de resíduos de Citosina e Guanina adjacentes localizados na região promotora de vários genes, (conforme ilustrado na Figura 2) e está associada à repressão gênica. As DNMTs transferem o grupo metil da molécula doadora S-adenosilmetionina (SAM) para a posição 5’ do anel piramidal da citosina, formando 5-metil desoxicitidina e S-adenosil homocisteína (SAH). Há duas famílias de DNMTs: as DNMTs de manutenção, responsáveis por manter os padrões de metilação durante o processo de replicação celular, incluindo DNMT1, que utiliza como substrato DNA hemimetilado, e as DNMTs com função de metilação propriamente dita dos genes (mecanismo denominado como “de novo metilação”), as DNMT3A e DNMT3B, as quais estão envolvidas na transferência de grupos metil para sítios previamente não metilados.

Figura 02. Desenho esquemático da metilação de DNA, que ocorre pelas enzimas DNMTs, preferencialmente nas ilhas CpG. Arte de: Ana kelly Vogt Kommers

Uma das propostas para explicar os possíveis mecanismos envolvidos com a repressão gênica mediada pela metilação do DNA seria através da diminuição direta da transcrição por meio do bloqueio dos fatores de transcrição aos seus sítios de ligação, além do papel das proteínas conectoras de metil-CpG, que reconhecem e se ligam ao DNA metilado. Destas, a mais conhecida é a MECP2 (Proteína 2 de ligação a metil-CpG).
Os processos de desmetilação ativos envolvem mecanismos de reparo por excisão de nucleotídeos e de bases e também por um complexo sistema enzimático, no qual a desmetilação do DNA é iniciada pela oxidação do 5-mC em 5-hidroximetilcitosina (5-hmC) por proteínas metilcitosina desoxigenase (TET), está sendo elucidado. A 5-hmC é geralmente associada a uma maior atividade gênica, entretanto Jin et al. (2011) descreveram que o conteúdo e a localização no gene alteram o papel sobre a transcrição. A 5-hmC está presente em vários tipos celulares, com altos níveis no encéfalo, especialmente nas células de Purkinje cerebelares. As enzimas TET podem transformar 5-hmC em 5-formilcitosina e 5-fC a em 5-carboxilcitosina.

3.Do ambiente ao gene
Para muitos, pode ser uma surpresa descobrir que o ambiente externo afeta os genes, modulando sua atividade. O efeito gênico do ambiente não é direto. As influências ambientais são mediadas por alterações nas células em que os genes residem. Diferentes tipos de célula reagem de forma diversa ao mesmo fator ambiental, seja ele estresse social ou carência alimentar no útero materno. Por sua própria natureza, e apesar do fato de os genes de todas as células do corpo serem os mesmos, os efeitos ambientais são sempre específicos para cada tipo de célula.
As células do fígado reagirão de uma maneira às carências nutricionais, os neurônios reagirão de outra, e muitos tipos de célula nem apresentam reação. Assim, ao determinar qualquer influência ambiental sobre o funcionamento dos genes, os cientistas se fixam em populações celulares específicos, como os neurônios de determinada área do cérebro, as células do fígado, do pâncreas ou de algum outro órgão. É fácil perceber que a fome holandesa afetou muitos tipos de células diferentes nos indivíduos expostos. Alguns foram afetados no cérebro, outros no coração, no fígado ou no pâncreas etc. Se comparássemos, digamos, as células hepáticas do grupo atingido pela fome com as de indivíduos não atingidos, provavelmente encontraríamos padrões diferentes de atividade gênica.
Alguns genes nas células do fígado dos afetados se mostrariam mais ativos e outros menos ativos que nas dos não afetados. A meta inicial é identificar quais são exatamente os genes dessas células cuja atividade é alterada pela carência alimentar durante a gestação. Depois, que é estabelecer um nexo causal entre as atividades gênicas alteradas nas células hepáticas e o diabetes, ou qualquer outra condição que queiramos explicar.O controle da atividade dos genes numa célula é chamado de regulação gênica (Figura 3).

Figura 03. Ilustração das etapas envolvidas na expressão gênica. Fonte: DE ROBERTIS, E. M. F; HIB, José. De Robertis bases da biologia celular e molecular. 4 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2012. 418p.

Os genes epigeneticamente regulados podem ser identificados por marcações características que aparecem sob a forma de apêndices químicos específicos. O tipo mais comum desses apêndices envolve o grupo metila, constituído por um átomo de carbono ligado a três átomos de hidrogênio (CH3). Quando um gene está ligado a grupos metila, diz-se que ele está metilado. Esse fenômeno não é uma questão de tudo ou nada, os genes podem apresentar diferentes graus de metilação. Em geral, quanto mais metilado, menos ativo é o gene.

4. Modulação Epigenética nas Doenças Respiratórias
Nas doenças respiratórias, as vias aéreas são expostas não somente aos poluentes externos como também ao estresse celular gerado pelo processo inflamatório e pela resposta imunológica. Este estresse pode acarretar alterações no epigenoma, o que consequentemente impacta na etiologia e na progressão das referidas enfermidades. Ainda, tem sido descrito que a exposição intrauterina e pós-natal, como o tabagismo, afeta diretamente a severidade do quadro clínico dessas doenças, o que também está associado à alteração de marcadores epigenéticos.
Serão descritos os mecanismos epigenéticos vinculados à fisiopatologia e progressão de duas importantes doenças respiratórias crônicas: a Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) e a Asma. Vale ressaltar que ambas apresentam sintomatologia e fisiopatologia semelhantes, sendo caracterizadas por obstrução ao fluxo aéreo.Contudo,em indivíduos com DPOC, na maioria das vezes, essa obstrução é irreversível enquanto que em asmáticos, isso ocorre em resposta à exposição a alérgenos, sendo a crise, normalmente, reversível com a retirada do fator causador.

5. Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC)
A DPOC vem se tornando uma doença de impacto global, apresentando uma prevalência superior a 10% no mundo. A Organização Mundial de Saúde (OMS) tem demonstrado que a DPOC causa aproximadamente três milhões de mortes/ano, representando uma das principais causas de mortalidade e morbidade nos dias de hoje.A OMS prevê que no ano de 2030 a mortalidade por DPOC passará de quarto lugar no ranking de morte por todas as causas para a terceira posição, vindo logo atrás de outras patologias como a doença arterial coronariana e o acidente vascular encefálico. Assim, o estudo dos aspectos etiológicos e fisiopatológicos da doença bem como estratégias preventivas e terapêuticas para a DPOC são essenciais.
Sabe-se que a exposição ao tabaco é o principal fator de risco associado ao desenvolvimento da patologia, porém, diversos outros fatores são causas importantes e preveníveis da doença. Conforme a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, o desenvolvimento da DPOC se dá através de alguns fatores de risco específicos, classificados em dois grupos: os fatores externos e os individuais, conforme observado na tabela 1.

Tabela 01. Fatores de risco para o desenvolvimento da DPOC.

No perfil fisiopatológico da DPOC, pode-se observar que o sistema surfactante é demasiadamente afetado pela destruição do parênquima pulmonar, dificultando, desta forma, que as trocas gasosas ocorram (Figura 4). Sendo assim, existe a perda da elasticidade pulmonar, ensejando um acúmulo de secreção. Esse quadro acarreta na obstrução do fluxo aéreo e, consequentemente, aumenta a capacidade residual funcional, ocasionando um quadro de hiper insuflação pulmonar e piorando a relação tensão/comprimento muscular diafragmático.

Figura 04. Fisiopatologia da Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica. Arte: Patricia Inacio.

Isto causa importante declínio da capacidade muscular de gerar força. Além da disfunção respiratória, ocorrem comprometimentos em outros órgãos como: ossos, sistema cardiovascular e músculo esquelético. A disfunção muscular de membros inferiores atinge aproximadamente um terço dos pacientes mesmo em fases precoces da patologia quando a obstrução das vias aéreas ainda não é considerada grave, o que pode contribuir para o comprometimento da capacidade funcional e estilo de vida sedentários desses indivíduos.
Em nível molecular, evidencia-se a ativação de células inflamatórias e de marcadores epigenéticos. Especificamente, observa-se alteração dos níveis de metilação do ácido desoxirribonucleico (DNA) e redução dos níveis de acetilação de histonas em diversos tecidos como o pulmonar, sangue periférico e músculo esquelético, conforme será abordado a seguir. Alterações nos níveis de metilação de DNA são observadas em tecido pulmonar de pacientes com DPOC. Um perfil de hipermetilação em alguns loci e hipometilação em outros é constatado nesses pacientes, o que está associado à diminuição da transcrição de genes protetores e ao aumento da transcrição de genes promotores dessa doença, levando a um prognóstico mais negativo. Assim, a hipermetilação das ilhas citosina fosfato guanina (CpG) visa estabelecer um antagonismo entre uma via protetora e uma via promotora da patologia da DPOC.
A hipometilação do gene promotor de histona deacetilase 6 (HDAC6), por exemplo, determina um aumento da expressão de HDAC6 em macrófagos alveolares. Esse processo contribui para a disfunção epitelial mediada pelo cigarro, através da promoção de autofagia. Além disso, a fumaça de cigarro pode estar associada a alterações na expressão de DNA metiltransferases (DNMTs) e a modificações na metilação de ilhas CpG na estrutura dinâmica do DNA em pacientes com DPOC, participando diretamente da piora do quadro clínico. A hipermetilação de genes específicos, como fator de coagulação II (trombina) receptor-like 3 (F2RL3) e receptor acoplado à proteína G (GPR15), mostrou estar associada não só ao tabagismo atual, mas também ao tempo de dependência do cigarro, apresentando relação dose resposta. Ainda, foi relatado que o tabagismo diminuiu a expressão de genes protetores. Tsaprouni et al. (2014) relataram uma hipometilação de DNA em sangue periférico, a qual foi apenas parcialmente reversível após a cessação do tabagismo, sugerindo que o cigarro induz a alterações reversíveis em marcadores epigenéticos nessa população. Chen (2012) observaram que pacientes com carga tabágica maior que 40 maços-ano apresentaram maior atividade da enzima HDAC quando comparados a indivíduos com menos de 40 maços-ano.
Com isso, foi estabelecida uma correlação positiva entre a atividade da HDAC e o tabagismo em pacientes com DPOC. Assim, evidencia-se que o tabagismo é um importante modulador de marcadores de acetilação de histonas e metilação de DNA em indivíduos com DPOC. O tabagismo e o estresse oxidativo diminuem também a atividade da enzima HDAC2 em macrófagos presentes em tecido pulmonar, o que promove a persistência do processo inflamatório em pacientes com DPOC devido à diminuição de citocinas anti-inflamatórias e ao aumento das pró-inflamatórias. Neste sentido,a redução da expressão de HDAC aumenta a acetilação global do gene promotor da interleucina 8 (IL-8), a qual apresenta atividade pró-inflamatória. Esse perfil molecular contribui para a resistência à terapia farmacológica com corticosteroides e está diretamente ligado à gravidade da doença e evolução do quadro clínico. Alguns estudos têm sugerido que pacientes com DPOC, independentemente do tabagismo atual, possuem a atividade da HDAC diminuída em macrófagos alveolares, e esta condição se encontra relacionada com a gravidade das limitações do fluxo aéreo. Esses achados corroboramos de Marwick(2004) que observaram, em macrófagos alveolares de tabagistas, uma redução da atividade da HDAC e na expressão da HDAC2, estando diretamente relacionada com o aumento da liberação de citocinas inflamatórias como fator de necrose tumoral alfa (TNF-α) e IL-822. Modificações epigenéticas no gene guanina-adenina-timina-adenina 4 (GATA 4), que se encontra associado com a função e o desenvolvimento do sistema cardiopulmonar, também foi relacionado com o estado de saúde geral de pacientes com DPOC.
Em um estudo experimental, foi observado que camundongos com deficiência nesse gene específico morrem no útero devido às anormalidades significativas na formação do sistema cardiovascular. Em estudo com humanos, foi descrito que o GATA 4 é fundamental para o desenvolvimento dos lobos pulmonares. Por outro lado, a mutação desse gene específico está associada com disfunções cardíacas congênitas e insuficiência das valvas cardíacas. Outro estudo mostrou que os pacientes com DPOC apresentam metilação do gene GATA 4, indicando uma redução na sua transcrição e expressão quando comparado com o grupo controle. Desta forma, os autores sugerem que o estado de metilação do gene GATA 4 pode ser um preditivo para avaliar o estado de saúde dos pacientes com DPOC. Como já comentado, a disfunção muscular esquelética é uma manifestação sistêmica presente na maioria dos pacientes com DPOC, principalmente em estágios mais avançados da patologia. Neste contexto, uma pesquisa recente relatou um aumento significativo nos níveis da HDAC4 em músculo vasto lateral de pacientes com essa doença.

6. Asma

A asma é uma doença com alta incidência na população em geral, acometendo principalmente os indivíduos em fases iniciais de suas vidas, configurando um sério problema de saúde pública. Na maioria dos casos, o início dos primeiros sintomas da doença ocorre antes dos 5 anos de vida, com prevalência maior no sexo masculino(relação 2:1). Já em adultos, essa prevalência tem tido um aumento nos últimos anos, estimando-se entre 5 e 10%,principalmente em países industrializados (Barnes, 1998).
Numerosas exposições pré-natais, como a asma materna ou atópica, desnutrição ou a obesidade gestacional, estresse materno durante a gravidez e a exposição a poluentes possuem forte influência sobre futuras doenças respiratórias, tanto para o feto quanto para a mãe. Entre esses, o tabagismo materno durante a gravidez é um dos fatores de risco mais importantes para o desenvolvimento da função pulmonar prejudicada e risco de asma (Upton e Svanes, 2014).
A fisiopatologia da asma é complexa e caracterizada pela obstrução variável das vias aéreas, a qual é ocasionada pela hiper-reatividade brônquica, edema e inflamação das mesmas (Figura 5). Vale ressaltar que tal condição é centrada em dois aspectos: a inflamação e a remodelação das vias (Anerud, 2015).A inflamação das vias aéreas é um fator importante no desenvolvimento do quadro asmático.A presença de edema e o acúmulo de secreção contribuem para a obstrução das vias, acarretando na hiper-reatividade brônquica e dificultando a passagem de ar.

Figura 05. Ilustração comparativa das Vias aéreas normal, asmática e com crise asmática. Fonte: pneumoesono.com

Os alérgenos, nas vias aéreas, ativam o aparecimento de mediadores inflamatórios provenientes dos macrófagos e demais células (Lepori, 2014), o que, juntamente com alterações dos níveis de marcadores epigenéticos, contribuem para o início e a evolução do quadro clínico (Comer, 2015).
Especificamente, observa-se alteração dos níveis de metilação do DNA e na atividade/concentração nas enzimas histona acetiltransferase (HAT) e HDAC evidenciadas principalmente em tecido pulmonar. Foi mostrado, em um estudo de coorte com 157 crianças comidade entre 2 e 10 anos, que o manuseio de animais bem como a exposição à fumaça de cigarro aumentam os níveis de metilação de DNA no marcador CD14 (glicoproteína). Isso explica, em parte, o entendimento das divergentes associações de alelos do marcador CD14 e sua relação com doenças alérgicas detectadas em diferentes ambientes através da modulação epigenética (Munthe-kaas, 2012). Em alguns doentes asmáticos graves, as células mononucleares do sangue periférico perdem plasticidade fenotípica, não conseguindo responder de forma adequada aos corticosteroides. Essa resistência ao uso de corticosteroides inalados tem sido associada ao aumento da expressão do fator de crescimento de colônias de macrófagos e granulócitos (GMCSF) e liberação de citocinas pró-inflamatórias, como o interferon-gama (IFN-γ), parcialmente devido à desregulação entre as concentrações de histona acetiltransferase (HAT) e HDAC (Hew, 2006). Desta forma, assim como ocorre na DPOC, o tratamento da asma com corticoesteroides modula marcadores epigenéticos.
A atividade da HDAC também é atribuída à resistência de fibroblastos pulmonares, percebida em patologias pulmonares fibróticas apoptóticas, tais como fibrose pulmonar intersticial e asma (Kidd, 2016), o que possivelmente leva a uma diminuição da expressão de genes protetores. A função da HDAC1 é essencial para que ocorra uma reparação e remodelação do epitélio das vias aéreas, bem como para o crescimento de células epiteliais, associando-se com a evolução do quadro clínico para asma grave uma vez que a atividade dessa enzima se encontra relacionada com a resistência a fármacos esteroides (Butler, 2012). O aumento e a remodelação do epitélio das vias aéreas estão associados com a gravidade da patologia, sendo constatada uma intensidade de sua atividade em pacientes com asma grave em comparação a pacientes com asma moderada (Wang, 2013). Sendo assim, a atividade da HDAC1 pode representar um importante biomarcador para distinguir a severidade dessa condição clínica.
A atividade da HAT também é alterada em tecido pulmonar de asmáticos. Esta se encontra aumentada tanto em biópsias pulmonares de adultos quanto em crianças (Ito, 2002 e Su,2008). Com base nesses achados, evidencia-se que o desequilíbrio HAT/HDAC está vinculado à gravidade e intensidade dos sintomas da asma previamente descritos.


Referências Bibliográficas

PRENDERGAST GC,Ziff, EB. Methylation-sensitive sequence-specific DNA binding by the cMyc basic region. Science. 1991.

ELSNER, VR; Ionara Rodrigues Siqueira. Epigenetica aplicada à saúde e à doenças: Princípios Fundamentais baseados em evidências atuais. 1ed. Porto Alegre: Editora Universitária Metodista IPA, 2016. 136p.

DE ROBERTIS, E. M. F; HIB, José. De Robertis. Bases da biologia celular e molecular. 4° ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2012. 418p.

BARNES,PJ. Woolcock AJ (1998). Difficult asthma. The European respiratory journal. 12(5):1209-18.

LEPORI R. Atlas Sistema Respiratorio. Madri: ARS Medica; 2004. p. 180.

COMER BS, Ba M, Singer CA, Gerthoffer WT (2015) Epigenetic targets fornovel therapies of lung diseases. Pharmacology & therapeutics. 147:91-110.

KIDD CD, Thompson PJ, Barrett L, Baltic S (2016). Histone Modifications and Asthma. The Interface of the Epigenetic and Genetic Landscapes. American journal of respiratory cell and molecular biology. 54(1):3-12.

BUTLER CA, McQuaid S, Taggart CC, Weldon S, Carter R, Skibinski G, et al.(2012) Glucocorticoid receptor beta and histone deacetylase 1 and 2 expressionin the airways of severe asthma. Thorax 67(5):392-8.

13. Técnicas moleculares

1. Extração de DNA
O isolamento do DNA (Ácido Desoxirribonucleico) é um procedimento fundamental e necessário para a realização das outras técnicas moleculares. A extração consiste basicamente na (1) obtenção do material biológico podendo ser: vírus, bactérias, células vegetais ou animais, (2) na lise celular, que envolve a ruptura da célula para acessar o DNA, (3) na purificação, remoção dos restos celulares e (4) precipitação dos ácidos nucléicos. Atualmente, existem kits comerciais que permitem a extração do material genético de qualquer tecido ou células com elevado grau de pureza e maior rapidez.

2. Eletroforese
A eletroforese tem como principal objetivo a separação de biomoléculas, com base nas propriedades elétricas e de massas. A eletroforese em gel é realizada em um suporte de matriz gelatinosa que possibilita a passagem de íons e o deslocamento de moléculas carregadas. O suporte pode ser do tipo gelatina, como a agarose, ou do tipo polímero, como a poliacrilamida. Para que os fragmentos de DNA sejam visualizados, o gel deve ser submetido à coloração, em geral, com corantes como brometo de etídio, que se intercala na estrutura do DNA e se torna fluorescente em presença da luz UV.
A migração de uma molécula de DNA fita dupla na eletroforese e uma relação de tamanho, sendo que as moléculas menores migram mais rapidamente que as maiores. O tamanho de uma molécula de DNA é uma medida do número de pares de bases que o forma.

Figura 05. Passo a passo da eletroforese: 1- gel; 2- aplicação do marcador; 3- aplicação das amostras; 4- indução da corrente elétrica; 5- deslocamento e separação dos fragmentos; 6- eletroforese completa. Fonte: Biomedicina Brasil. Disponível em:

3. Reação em Cadeia da Polimerase (PCR)
Descrita por Kary Mullis, no final dos anos 80, a reação em cadeia da polimerase, mais conhecida pela sigla PCR (Polymerase Chain Reaction), explora a capacidade de replicação in vitro, sendo um método simples e rápido para a amplificação de um segmento específico de DNA.
A técnica de PCR baseia-se em três passos: desnaturação, anelamento e extensão. O primeiro passo, a desnaturação, consiste no rompimento das pontes de hidrogênio entre as duas fitas de DNA, sendo essencial expor a amostra à 94ºC. O segundo passo, o anelamento, permite que os primers se liguem a sequências complementares no DNA genômico, nesta fase a temperatura varia de 50-60ºC. Por fim, o terceiro passo, a extensão, ocorre à 72ºC, nesta etapa a DNA polimerase, atua na síntese de novas fitas de DNA. As alternâncias de temperatura ocorre em média de 30 a 35 vezes com auxílio do termociclador.
Em relação aos reagentes necessários, a PCR depende de DNA genômico, dNTPs, enzima DNA polimerase, oligonucleotídeos (primers) e solução-tampão. A enzima escolhida para atuar no processo é a DNA polimerase da bactériasThermusaquaticus, conhecida como taq polimerase, que apresentam uma elevada termoestabilidade. Essa descoberta impulsionou a realização da PCR, visto que antes da taq polimerase, usava-se a DNA polimerase da E. coli, que a cada etapa da desnaturação era preciso ser reposta.

Figura 03. Página 268. Gráfico de temperatura relacionado com as etapas da PCR. Fonte: Genética Essencial. PIMENTEL, M.

Resumidamente, essa é a técnica de PCR, passo-a-passo:
1. A amostra de DNA, a enzima que faz a replicaçào (taq DNA polimerase), os nucleotídeos de DNA e os primers são colocados em um tubo de ensaio.
2. O tubo de ensaio é colocado em um termociclador. Os passos seguintes, de aquecimento e resfriamento, acontecem dentro deste equipamento.
3. O tubo é aquecido a 94ºC para separar (desnaturar) a dupla fita de DNA.
4. Cada fita simples do DNA que foi desnaturado serve de molde para a síntese de novas fitas. Para isso, resfria-se a 54ºC onde os primers se anelam ao início das duas fitas simples.
5. O tubo é aquecido novamente a 72ºC para a duplicação da fita.

Figura 04. Página 269. Representação da PCR. Fonte: Genética Essencial. PIMENTEL, M.

4. Sequenciamento de DNA
O conhecimento da sequência correta de nucleotídeos de um fragmento de DNA se tornou uma etapa indispensável na pesquisa em genética. Atualmente, com as técnicas mais desenvolvidas e sofisticadas, o sequenciamento vem se tornando mais acessível, e como consequência, estudos com genoma e sua variabilidade tem aumentado.
O primeiro método de sequenciamento rápido foi o plus-minus, desenvolvido em 1977 e utilizado no sequenciamento completo do primeiro organismo. Outro método conhecido como Maxam-Gilbert, que consiste na modificação química das purinas e pirimidinas de moléculas de DNA marcadas radioativamente, seguida de clivagem, resultando na formação de fragmentos de diferente tamanhos. Os fragmentos são separados por eletroforese e reconhecidos por meio de autorradiografia.
Apesar do sucesso, o método Maxam-Gilbert foi suplantado pelo método enzimático, desenvolvido pela equipe do Dr. Sanger, que se baseia na síntese de uma fita de DNA a partir do DNA-molde a ser sequenciado. Muitos foram os avanços realizados pelos pesquisadores na utilização da metodologia de sequenciamento em eletroforese capilar com base na técnica de Sanger. Entretanto, tornou-se necessário obter grande quantidade de dados, incluindo a determinação de genomas completos. Deu-se início, então, à corrida para o desenvolvimento de métodos mais rápidos, baratos e confiáveis.
Assim, iniciou-se a era da genômica, cujo ápice científico foi a determinação da sequência do genoma humano em 2003. O sucesso alcançado neste projeto está relacionado ao desenvolvimento de novos vetores de clonagem, sequenciadores com maior desempenho e análise de dados por computadores mais potentes.

5. Marcadores moleculares
Para a descrição e identificação do DNA são necessárias tecnologias de análise molecular que permitem determinar pontos de referências nos cromossomos, tais tecnologias são conhecidas como marcadores moleculares. Por marcadores moleculares define-se qualquer fenótipo molecular originado de um gene expresso ou de um segmento específico do DNA.
As diferentes metodologias da genética molecular têm permitido estudos de evolução, de diversidade genética, de identidade, origem genética e identificação de novas variantes.
Existem vários questionamentos sobre o uso apropriado dos marcadores moleculares, incluindo questões metodológicas de obtenção e análise dos marcadores genéticos. Para a obtenção de marcadores genéticos-moleculares, é exigida uma infra-estrutura apropriada para realizar as diferentes fases da metodologia. De modo geral, são necessários equipamentos para a extração de DNA, amplificação via PCR, separação por eletroforese, fotodocumentação e análise estatística dos marcadores gerados.
Cada tecnologia apresenta vantagens e desvantagens, o uso de uma ou de outra vai depender, entre outros fatores, do objetivo do estudo, infra-estruturadisponível, recursos financeiros e nível de conhecimento da genética molecular da espécie a ser estudada.

5.1 Principais marcadores genéticos
Isoenzimas – grupo de múltiplas formas moleculares de uma enzima, resultante de variações alélicas dos genes codificadores. As principais vantagens dessa técnica ao o baixo custo, a facilidade e rapidez da metodologia. As principais desvantagens são o baixo número dos sistemas enzimáticos polimórficos e a influência das condições ambientais e dos tecidos vegetais nas atividades enzimáticas.
RAPD (RandomAmplifiedPolymorphic DNA) - RAPDs são fragmentos de DNA amplificados pela PCR utilizando primers curtos de sequencia aleatória. As principais vantagens da técnica são a facilidade e a rapidez de obtenção de marcadores, a necessidade de quantidades mínimas de DNA e a universalização das analises. As principais desvantagens referem-se à dominância dos marcadores, não diferenciando os locos em heterozigose dos locos em homozigose e à baixa reprodutibilidade das marcas por causa da sensibilidade da tenica às condições experimentais.
RFLP (RestrictionFragmentLengthPolymorphism) – RFLPs são fragmentos de DNA obtidos de enzimas de restrição, separados por eletroforese, e visualizados por meio de hibridização com sondas de sequências homologas marcadas com radioatividade ou fluorescência. As principais vantagens da técnica são a co-dominância dos marcadores e a alta reprodutibilidade deles. As desvantagens são a exigência de grande quantidade e a qualidade do DNA a ser analisado, necessidade de sondas especificas para a hibridização e o fato de a técnica ser mais trabalhosa, demorada e cara comparada a outras técnicas.
Microssatélites – são unidades muito curtas repetidas em tandem, ou seja, uma após a outra. São conhecidos também como SSR (SimpleSequenceRepeats). As principais vantagens são a co-dominância dos marcadores, o alto nível de polimorfismo que pode ser detectado, a alta reprodutibilidade das marcas e a possibilidade de detecção de vários microssatélites no mesmo gel facilitando a operacionalização das análises. As principais desvantagens são o alto custo requerido no desenvolvimento de primers específicos, quando eles não estão disponíveis para a espécie a ser estudada, e o fato de bandas especificas ou géis de baixa resolução poderem dificultar a acurada avaliação de polimorfismo.
AFLP (AmplifiedFragmentLengthPolymorphism) – os AFLPs são fragmentos de DNA obtidos com a digestão do DNA com enzimas de restrição, seguidos da ligação de oligonucleotideos adaptadores e amplificação seletiva dos fragmentos via PCR. As principais vantagens dos AFLPs são a geração de grande numero de polimorfismo por reação e o fato de não haver necessidade de conhecimento prévio de dados de sequência de DNA para a construção de primers utilizados. As principais desvantagens são a dominância dos marcadores, o alto custo e as varias etapas e reagentes necessários à obtenção dos marcadores.
Minissatélites – são unidades de 10 a 100pb repetidas em tandem, flanqueadas por sítios conservados de endonucleases de restrição. Também são conhecidos por VNTRs (VariableNumberof Tandem Repeats). As principais vantagens desse marcador são a alta reprodutibilidade das marcas e a geração de muitas bandas informativas por reação. As desvantagens são relacionadas à dominância dos marcadores e ao fato de a técnica ser mais trabalhosa, demorada e cara, à semelhança dos marcadores RFLP.
CAPS (CleavedAmplifiedPolymorphicSequence) – CAPS são fragmentos de DNA amplificados via PCR, utilizando-se de primers específicos, seguido da digestão com endonucleases de restrição. As principais vantagens são a co-dominância e a alta reprodutibilidade dos marcadores e a principal desvantagem é a necessidade de conhecimento prévio de sequência de DNA para a construção dos primers.
SSCP (Single-StrandConformationPolymorphism) – são fragmentos de DNA amplificados por PCR usando primers específicos. As principais vantagens dos SSCPs são a baixa quantidade de DNA requerida para as analises e a co-dominancia dos marcadores. As desvantagens são a necessidade do conhecimento prévio de sequencia para a construção dos primers e a falta de reprodutibilidade quando as condições da eletroforese não estão bem padronizadas.
ISSR (Inter SimpleSequenceRepeats) – são fragmentos de DNA amplificados por PCR usando um único primer construído a partir de sequencia de microssatélites. As principais vantagens são a geração de grande numero de bandas informativas por reação e o fato de não haver a necessidade de conhecimento prévio de dados de sequencia de DNA para a construção do primer utilizado. A principal desvantagem é a dominância dos marcadores.
PCR-sequencing – esse tipo de marcador genético-molecular envolve a determinação da sequencia de nucleotídeos do fragmento de DNA amplificado via PCR utilizando primers específicos para cada região do genoma estudado. As principais vantagens é a alta reprodutibilidade e a principal desvantagem é o baixo nivel de variação em estudo intra-especifico, alem do custo da técnica.
SNP (Single NucleotidePolymorphism) - são marcadores moleculares utilizados para identificar mutações e polimorfismos baseados na posição de um único nucleotídeo. A principal vantagem, em comparação com outros marcadores, é a possibilidade de detecção de grande quantidade de polimorfismos entre alelos de determinado gene. A principal desvantagem é a necessidade do conhecimento prévio de sequencia do gene de interesse e o custo/infra-estrutura da técnica envolvida nas etapas necessárias ao seqüenciamento dos diferentes fragmentos de DNA.

5.2 Principais aplicações dos marcadores genéticos
Os marcadores genéticos-moleculares permitem gerar grande quantidade de informações sobre a identidade genética, a diversidade e a freqüência gênica. Os marcadores podem auxiliar nas diferentes etapas, como a coleta, manutenção, caracterização, manejo, ampliação e uso dos recursos genéticos.
As informações moleculares podem complementar as informações ecológicas, morfológicas e agronômicas dos recursos genéticos, contribuindo para aumentar a eficiência dos processos de coleta, direcionar o enriquecimento da base genética, analisar a diversidade e pureza genética, identificar acessos duplicados, auxiliar trabalhos de classificação botânica e filogenia, subsidiar a seleção de genitores, entre outros.

5.3 Princípio da Análise dos Marcadores Genético-Moleculares
Embora exista um grande número de marcadores genético-moleculares, o principio da analise desses marcadores é o mesmo: marcadores comuns aos acessos significam semelhança genética e marcadores não-comuns significam diferenças genéticas. Os dados sobre semelhança e diferença genética entre acessos de determinado banco de germoplasma permitem gerar grande quantidade de informações sobre a diversidade genética e relacionamentos filogenéticos entre eles.
Para a análise dos marcadores genético-moleculares é a codificação dos fragmentos moleculares em dados binários ou dados de coincidência alélica. Os dados para marcadores dominantes são codificados como 1 (presença de marcador) ou 0 (ausência de marcador). Para os co-dominantes são codificados como 0 (ausência de alelos comuns no loco), ½ (um alelo comum no loco) e 1 (os dois alelos comuns no loco).

Exercícios
1. Cite algumas vantagens dos marcadores moleculares sobre os marcadores morfológicos.

2. Sobre a eletroforese de DNA, écorretoafirmar que
01) é realizada utilizando-se uma placa com gel especial, fragmentos de DNA e aplicação de corrente elétrica.
02) os fragmentos de DNA que possuem cargas negativas se deslocam para o polo positivo, quando é aplicada uma descarga elétrica na placa de gel. 04) a eletroforese de DNA tem sido utilizada para a identificação de pessoas, nas investigações policiais, em processos judiciais e na determinação da paternidade.
08) gêmeos monozigóticos podem ser distinguidos pela análise do DNA nuclear.
16) os fragmentos separados por eletroforese são formados por DNA com cadeia dupla.

3. Com relação à Reação em Cadeia da Polimerase (PCR), julgue os itens abaixo e, em seguida, assinale a opção correta.
I – Na PCR, a região do DNA que deverá ser amplificada é demarcada pelo oligonucleotídeo iniciador e as novas fitas de DNA sintetizadas têm início a partir desse iniciador.
II – O resultado final da PCR é a amplificação de uma região específica do DNA.
III – ATaq polimerase, DNA polimerase extraída da bactéria Thermusaquaticus, é uma das limitações da PCR, por ser termossensível, sendo necessário ser adicionada a cada ciclo da reação.

Estão certos apenas os itens:
(A) I e II.
(B) II e III.
(C) I, II e III.

Gabarito
1. Marcadores moleculares são geralmente, neutros em relação a efeitos fenotípicos, com mínimo ou nulo efeito. Já marcadores morfológicos muitas vezes coíbem ou restringem o desenvolvimento normal da planta e seu controle genético pode afetar, ou ser afetado, por genes controlando outros caracteres.
2. S = 23. Estão todas corretas.
3. Letra C.

Referências Bibliográficas

PIMENTEL, M. M. G.; GALLO, C. V. de M.; SANTOS-REBOUÇAS, C. B. Genética Essencial. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.

GELAPE, F.F. Marcadores Genético Moleculares aplicados a programas de conservação e uso de recursos genéticos. Planaltina, DF: Embrapa Cerrados. 200