domingo, 8 de outubro de 2017

6. Herança do sexo

1. Sistemas cromossômicos de determinação sexual
A teoria cromossômica da herança diz que os genes estão situados nos cromossomos, a mesma foi dada pela descoberta de que o sexo de alguns insetos é determinado pela presença ou ausência de determinados cromossomos.
Esses cromossomos foram descobertos em 1891, por Hermann Henking, enquanto observava o núcleo das células de insetos machos. Ele percebeu uma estrutura diferente, a qual não sabia a função, portanto, ele chamou de corpúsculo X. Mais tarde, em 1899 Clarense McClug, estudou células de gafanhotos e descobriu que as fêmeas tinham um cromossomo a mais que os machos, e percebeu que esse cromossomo poderia ter ligação com a determinação do sexo (Figura 1). Em 1905, Stevens e Wilson, demonstraram que as fêmeas tinham dois corpúsculos X enquanto os machos só tinham um. Em alguns insetos, eles perceberam que um par de cromossomos era diferente, pois continha um maior e um menor (Figura 2). Nomearam assim, o menor cromossomo, como Y. Com esse estudo, mostraram que os cromossomos X e Y separam-se para células diferentes na formação de espermatozoides.

Figura 01. Sistema de determinação de sexo X0. Os machos possuem um cromossomo X único enquanto que as fêmeas possuem XX. Fonte: Guellity Marcel.

Figura 02. Drosofilas apresentam 4 pares de cromossomas, um determina o sexo. Na fêmea a morfologia dos cromossomos é igual XX e no macho diferente XY, em que Y é menor e com menos genes que X. Fonte: Ondina Espírito Santo.

Como o sexo é herdado como as outras características, ficou comprovado que os genes estão mesmo nos cromossomos. Ou seja, o sexo é determinado por um par de cromossomos, os quais são conhecidos como cromossomos sexuais. Os cromossomos não-sexuais, que são os mesmos para machos e fêmeas, são conhecidos como cromossomos autossomos.

1.1. Determinação sexual XX-XO
O mecanismo que McClung utilizou para estudar a determinação sexual dos gafanhotos é um dos mais simples e conhecido como Sistema XX-XO. Nesse sistema, as fêmeas possuem dois cromossomos X (XX) e os machos possuem apenas um (XO). Lembrando: não existe cromossomo O, a letra apenas representa a ausência de um cromossomo.
Na meiose das fêmeas, os dois cromossomos X formam par e então se separam, com um cromossomo X entrando em casa ovócito. Nos machos, só há um cromossomo X, o qual segrega para metade dos espermatozoides, e a outra metade não recebe cromossomo sexual. Como os machos produzem dois tipos diferentes de gametas, um com cromossomo X e um sem cromossomo X, eles são chamados de sexo heterogamético. As fêmeas produzem dois gametas iguais, portanto, são chamadas de sexo homogaméticos.

1.2. Determinação sexual XX-XY
Em muitas espécies, as células dos machos e fêmeas possuem o mesmo número de cromossomos. A diferença é que, as células das fêmeas têm dois cromossomos X (XX) e as células dos machos tem um cromossomo X e um cromossomo menor Y (XY).
Em humanos e alguns outros organismos, o cromossomo Y é acrocêntrico, ou seja, o centrômero se localiza perto da extremidade. Nesse sistema, o macho também é de sexo heterogamético, por conter X em um gameta e Y em outro, e a fêmea também é homogamética, por conter X nos dois gametas (Figura 3).

Figura 03. Os cromossomos X e Y em humanos diferem em tamanho e conteúdo genético. Fonte: Pierce, B.

Embora os cromossomos X e Y em geral não sejam homólogos, eles formam par e segregam para células diferentes durante a meiose. Eles podem parear porque esses cromossomos são considerados homólogos em pequenas regiões, chamadas de regiões pseudo-autossômicas.

1.3. Determinação sexual ZZ-ZW
Nesse sistema de determinação sexual, a fêmea é heterogamética e o macho é homogamético. Para evitar que confundam com o sistema XX-XY, os cromossomos sexuais nesse sistema são chamados de Z ou W. As fêmeas são ZW e os machos são ZZ.
O sistema ZZ-ZW é encontrado em aves, cobras, borboletas, alguns anfíbios e alguns peixes (Figura 4). Após a meiose, metade dos ovócitos das fêmeas tem um cromossomo Z e a outra metade tem um cromossomo W. Enquanto nos machos, todos os espermatozoides têm um cromossomo Z.

Figura 4. O cromossomo sexual presente tanto em fêmeas quanto em machos é o cromossomo Z, enquanto o cromossomo sexual W está presente somente em fêmeas. Nesse caso machos são ZZ e fêmeas ZW. Fonte: Guellity Marcel.

1.4. Sistema hapodiploide
Alguns insetos da ordem Hymenoptera (abelhas, vespas, formigas) não tem cromossomos sexuais. Em vez disso, o sexo é baseado no número de grupos de cromossomos encontrados no núcleo de cada célula. Os machos desenvolvem-se de ovócitos não fertilizados, e as fêmeas desenvolvem-se de ovócitos fertilizados (Figura 5).
As células de himenópteros machos possuem apenas um único conjunto de cromossomos herdados da mãe, ou seja, eles são haploides. Já as células das fêmeas possuem dois conjuntos de cromossomos, um herdado da mãe e outro herdado do pai, ou seja, elas são diploides.

Figura 05. Os machos têm metade do número de cromossomos que uma fêmea possui, na qual caracteriza o sistema haploide. Fonte: John Latto.

1.5.Sistema gênicos de determinação sexual
Em algumas plantas e protozoários, o sexo é geneticamente determinado, mas não existem diferenças óbvias entre os machos e as fêmeas. Ou seja, não existem cromossomos sexuais. Os genótipos em um ou mais locos determinam o sexo, por isso, é conhecida como determinação gênica de sexo.
É importante compreender que, mesmo nos sistemas de determinação cromossômica do sexo, ou seja, sistemas que utilizam X e Y, o sexo é determinado por genes individuais. Por exemplo, nos mamíferos, o gene SRY situado no cromossomo Y é quem determina o sexo masculino. Assim, o mesmo acontece na determinação gênica de sexo: o sexo é controlado por genes individuais.

2. Herança ligada ao sexo
Uma importante extensão dos princípios básicos de hereditariedade de Mendel é o padrão de herança exibido por características ligadas ao sexo. Genes situados no cromossomo X determinam características ligadas ao cromossomo X. Genes situados no cromossomo Y determinam características ligadas ao cromossomo Y. Como o cromossomo Y de muitos organismos contém pouca informação, a maioria das características determinada pelo sexo são ligadas ao X.

2.1. Daltonismo ligado ao cromossomo X em humanos

O daltonismo é uma deficiência recessiva ligada ao cromossomo X, que afeta diretamente a percepção das cores. No olho humano, a cor é percebida nas células-cone sensíveis à luz que revestem a retina. Cada célula-cone contém um dos três pigmentos capazes de absorver a luz de determinado comprimento de onda. Cada um dos três pigmentos é codificado por um locus separado: o locus para o pigmento azul é no cromossomo 7, e os locus para os pigmentos verde e vermelho estão situados próximo do cromossomo X.
Os tipos mais comuns de daltonismo humano são causados por efeitos dos pigmentos vermelho e verde, assim, nos referimos a essa condição como daltonismo verde-vermelho. É possível identificar indivíduos daltônicos por meio do teste de Ishihara (Figura 6).

Figura 06: O teste de Ishihara possuevárioscírculos com cores ligeiramentediferentes e algunsnúmeros no centro dos círculos que apenas o indivíduo com visão normal consegue ver. Fonte: Cemahospital.com

As mutações que produzem defeito de visão em cores geralmente são recessivas, e, como os genes que codificam os pigmentos estão situados no cromossomo X, o daltonismo verde-vermelho é herdado como uma característica recessiva.
Se uma mulher homozigota para visão normal, se reproduz com um homem daltônico, todos os gametas produzidos pela mulher conterão um alelo para visão normal em cores. Metade dos gametas do homem receberá o cromossomo X com o alelo para daltonismo, e a outra metade receberá o cromossomo Y, que não leva alelos que afetam a visão em cores. Assim, a reprodução resultará em mulheres e homens com visão de cores normal.
Mas, se uma mulher daltônica se reproduz com um homem de visão normal, a mulher produz apenas gametas X portadores de daltonismo. O homem produz gametas que contenham X e outros que contenham Y. A reprodução assim resultará em mulher com visão de cores normal e homens daltônicos. As mulheres serão daltônicas apenas se tiverem recebido alelos recessivos de ambos os genitores.
Nesse casamento de daltonismo, note que uma mulher afetada passa a característica recessiva ligada ao cromossomo X para seus filhos, mas não para suas filhas. Enquanto o homem afetado, passa as características para seus netos através de suas filhas, mas nunca para seus filhos. Assim, as características recessivas ligadas ao cromossomo X podem alternar entre os sexos, aparecendo em mulheres em um geração e homens na geração seguinte(Figura 7).

Figura 07. O daltonismo verde-vermelho herdado como características recessivas ligadas ao cromossomo X. Note que X+ representa alelo com visão normal e Xc representa alelo com daltonismo. FONTE???

9. Compensação de dose
A presença de números diferentes de cromossomo X em machos e fêmeas apresenta um problema especial no desenvolvimento. Como as fêmeas tem duas cópias de cada gene ligado ao X e os machos possuem uma cópia, a quantidade de produto gênico de genes ligados ao X seria diferente nos dois sexos, pois as fêmeas produziriam o dobro de proteínas que os machos.
Os animais superam esse problema potencial pela compensação de dose, que equilibra a quantidade de produto proteico produzido pelos genes ligados ao X nos dois sexos. Os mamíferos placentários usam o mecanismo de compensação de dose inativando um cromossomo X da fêmea.
Quem descobriu essa hipótese de inativação do cromossomo X da fêmea foi Murray Barr, por isso, o cromossomo inativado é conhecido como corpúsculo de Barr. Em 1949, Barr estava observando células de gatas, quando percebeu corpos condensados de coloração escura no núcleo das células. O corpúsculo de Barr também é conhecido como cromatina sexual (Figura 8).

Figura 08. Um corpúsculo de Barr é um cromossomo X inativado. (a) célula feminina com cromatina sexual. (b) célula masculina sem cromatina sexual.

A inativação do X é aleatória. Nos humanos, dentro das primeiras semanas de desenvolvimento, um cromossomo X fica inativo e assim ele permanece inativo também nas células somáticas. Assim, as células vizinhas tendem a ter o mesmo cromossomo X inativado, produzindo um padrão de manchas para a expressão de uma característica ligada ao X.
Essa presença de manchas pode ser vista em gatos tortoiseshell. (Figura 9).Embora sejam muitos os genes que contribuam para a pelagem gatos domésticos, um único locus ligado ao X determina a presença da cor laranja. Existem dois possíveis alelos nesse locus: X+ que não produz laranja (geralmente produz preto), e X0 que produz a pelagem laranja. Os machos são hemizigotos, portanto, podem ser pretos (X+Y) ou laranja (X0Y), mas não preto e laranja (com raras exceções). As fêmeas podem ser pretas (X+X+), laranjas (X0X0) ou tortoiseshell(X+X0). Cada mancha laranja é um clone de células derivadas de uma célula original onde o alelo preto era inativado, e cada mancha preta é um clone de células derivadas de uma célula original onde o alelo laranja era inativado.

Figura 09. A distribuição malhada da cor em gatos tortoiseshell. Fonte: Warren Fotografia.

10. Características ligada ao Z

Em um organismo com determinação sexual ZZ-ZW, os machos são homogaméticos (ZZ) e as fêmeas são heterogaméticas (ZW). A herança de características ligadas ao Z é a mesma das características ligadas ao X, à exceção de que o padrão de herança nos machos e fêmeas é revertido.
Um exemplo de características ligada ao Z é o fenótipo camafeu no pavão azul indiano (Pavocristatus)(Figura 10). Nessas aves, a plumagem tipo selvagem é azul-metálico brilhante. A fêmea é heterogamética e o macho é homogamético. A plumagem do pavão que produz plumagem marrom resulta de um gene ligado ao Z (Zca) que é recessivo em relação ao alelo tipo selvagem azul (Zca+). Se uma fêmea azul é cruzada com um macho camafeu, todas as fêmeas de F1 são camafeu e todos os machos de F1 são azuis. Já quando uma fêmea camafeu é cruzada com um macho azul, toda a prole de F1 é azul.

Figura 10. O fenótipo camafeu no pavão azul indiano é herdado como caraterísticas recessivas ligadas ao Z. (a) fêmea azul cruzada com macho camafeu. (b) fêmea camafeu cruzada com macho azul.

11. Características ligadas ao Y
As características ligadas ao Y apresentam padrão de herança diferente e estão presente somente nos machos, pois são os únicos que apresentam cromossomo Y. Toda a prole masculina de um macho com características ligadas ao Y apresentará a característica, pois todos os machos herdam o cromossomo Y do pai.
O Projeto Genoma Humano determina a sequência genética da maioria dos cromossomos humanos de hoje. Ele revelou que cerca de dois terços do cromossomo Y são heterocromatina, que consistem em sequências curtas de DNA que são repetidas muitas vezes e não contém genes ativos. O outro terço consiste em eucromatina, mas existem alguns genes presentes. A função da maioria dos genes ligados ao Y é pouco compreendida, muitos parecem influenciar o desenvolvimento masculino e a fertilidade. Alguns são expressos pelo corpo, mas muitos são expressos predominante nos testículos.
Nos mamíferos, a determinação do sexo masculino depende de um gene localizado no cromossomo Y, denominado SRY, (do inglês Sex-Determining Region Y). A proteína codificada por esse gene induz, no embrião a formação de testículos, aparentemente por ativar outros genes em diversos cromossomos. A testosterona e outras substâncias produzidas nos testículos atuam no desenvolvimento de órgãos genitais e de outras características típicas do sexo masculino. Há casos em que o gene SRY sofreu mutação e por isso, a proteína por ele codificada não é funcional. Embriões portadores dessa mutação, mesmo tendo cariótipo masculino, desenvolvem fenótipo feminino. Embriões de mamíferos sem cromossomo Y não possuem o gene SRY e desenvolvem fenótipo feminino. É o que ocorre na síndrome de Turner na espécie humana, em que as pessoas afetadas apresentam cariótipo 24, XO.

Exercícios do capítulo
1) Como o sexo heterogamético se difere do sexo homogamético? Assinale a alternativa correta.
a)O sexo heterogamético é masculino e o sexo homogamético é feminino.
b)Os gametas do sexo heterogamético tem cromossomos sexuais diferentes, e os gametas do sexo homogamético tem cromossomos sexuais iguais.
c)Os gametas do sexo heterogamético tem um cromossomo Y e os gametas dos sexo homogaméticos tem um cromossomo X.

2)
O que são corpúsculos de Barr? Quantos corpúsculos de Barr um homem com os cromossomos XXXYY terá em cada uma de suas células?

3) Que características são exibidas pela herança ligada ao X?

4) Que características são exibidas por uma característica ligada ao Y?

Gabarito
1) Letra “b”.

2)
O corpúsculo de Barr é um cromossomo X inativo. Um homem com cromossomos XXXYY possui dois corpúsculos de Barr, visto que um X precisa permanecer ativo.

3)
Os machos apresentam os fenótipos de todas as características ligadas ao X, independente de os alelos ligados ao X serem normalmente recessivos ou dominantes. Os machos herdam as características ligadas ao X de suas mães, transmitem características ligadas ao X para todas as suas filhas, e, através de suas filhas, para os descendentes das filhas, mas não para os seus filhos. +

4) As características ligadas ao Y só aparecem nos macho. As características autossômicas limitadas aos machos também só aparecem nos machos, mas podem ser transmitidas para os filhos por suas mães.


Referências Bibliográficas


PIERCE, B.A. Genética: um enfoque conceitual. Traduzido por Paulo Motta. Rio de Janeiro: Guanabara Joogan. 3ºed, 2011.

ALBERTS, bruce; JOHNSON ; LEWIS, et al. Biologia molecular da célula. Tradução Ana Letícia Vanz et al. 5.ed.-Porto Alegre: Artmed, 2010.

PIMENTEL, M. M. G.; GALLO, C. V. de M.; SANTOS-REBOUÇAS, C. B. Genética Essencial. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.


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